A Aproximação Facial Forense de Seqenenre-Taa-II (c. 1558-1553 a.C)

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Cicero Moraes
3D Designer, Arc-Team Brazil, Sinop-MT, Brasil - Bacharel em Marketing, Dr. h. c. FATELL/FUNCAR (Brasil) e CEGECIS (México) - Membro da Mensa Brasil e da Intertel - Revisor convidado: Elsevier, Springer Nature e PLoS - Guinness World Records 2022: First 3D-printed tortoise shell.
Michael Habicht
Egiptólogo e Arqueólogo, Colégio de Humanidades, Arte e Ciências Sociais, Universidade de Flinders, Adelaide-SA, Austrália.
Data da publicação: 30 de maio de 2024
ISSN: 2764-9466 (Vol. 5, nº 2, 2024)

Aviso

O presente trabalho é independente, sem vínculo com a instituição que guarda os restos mortais de Seqenenre-Taa-II, tampouco com as universidades e instituições que estudaram-no dentro do escopo forense. O elemento motivador do capítulo é a criação de material didático para o ensino da técnica de aproximação facial, ao testar a possibilidade de se reconstruir uma face utilizando dados originalmente disponíveis em matérias de jornais, mídias online, livros e journals acadêmicos.

Resumo

O escopo do presente capítulo é efetuar a aproximação facial de Seqenenre-Taa-II, tanto do rosto em vida como o estado post mortem, além de ilustrar a posição dos objetos que causaram as lesões, tendo como base dados publicados em artigos, mídias e livros sobre o tema.

Atenção

Este material utiliza a seguinte licença Creative Commons: Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0).

Atenção

Caso encontre algum erro no material, sinta-se à vontade para informá-lo aos autores, o contato pode ser feito via redes sociais acadêmicas informadas no início do capítulo.

Introdução

Seqenenre-Taa-II, também conhecido como “o bravo”, foi um rei egípcio que governou durante o final da 17ª Dinastia (c. 1558-1553 a.C), período que coincide com a ocupação do Egito pelos hicsos. Apesar dos egípcios controlarem o sul da região, parte considerável do império pagava tributos ao Rei Hicso. Havia grande hostilidade entre os povos, traduzida em um papiro da época que documentava o envio de uma mensagem do Rei Hicso a Seqenenre, afirmando que hipopótamos barulhentos em Tebas, estavam perturbando o seu sono em Avaris (644 Km de distância), solicitando que a piscina onde os animais estavam fosse destruída [A_Saleem_2021]. Existem poucas evidências acerca do reinado de Seqenenre, como o relato de um soldado cujo pai lutou na frota naval do rei, o supracitado conto literário envolvendo o hipopótamo e a piscina, uma porta de calcário com nome de Seqenenre em Deir el-Ballas, uma torre de observação construída durante o seu reinado, um papiro que indica a localização da tumba de Seqenenre em Tebas e duas estelas do seu reinado encontradas em Karnak [A_Shaw_2009].

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Fig. 1 Fotografia da múmia de Seqenenre após ser desenfaixada, percebe-se a língua entre os dentes e o ferimento na parte superior da cabeça está oculto pelos cabelos. Planche III, Maspero (1889) [A_Maspero_1889]. Imagem sob domínio público segundo as leis brasileiras e européias.

Em junho de 1886 a múmia de Seqenenre foi analisada por Gaston Maspero (1846-1916). O egiptólogo descreveu que ao desenrolar-la, sentiu um cheiro desagradável, que havia um ferimento de 11 x 36 mm logo acima do osso da sobrancelha, que a língua havia sido mordida entre os dentes (Fig. 1, ou ver Placa III no livro citado) e assim permanecido, que havia um ferimento maior na testa, oculto pelos cabelos e que teria sido provocado por um machado. Na mesma publicação (pp. 776-778) o Dr. Fouquet, coautor da obra, menciona o ferimento, indicando suas dimensões em 54 x 11 mm. Maspero então desenvolveu a sua hipótese acerca do que poderia ter acontecido: 1) O rei é atingido no queixo e cai; 2) Quando caído recebe dois golpes, um com machado no topo da cabeça (com vazamento de massa cerebral pela lesão) e outro com uma lança ou punhal acima do olho. Além disso também estimou a idade em torno de 40 anos no momento da morte, que seria alto, esbelto, com a cabeça pequena e alongada, cabelos pretos, finos e cacheados, com comprimento médio de 115 mm em uma cabeça bem guarnecida por estes, com testa alta, nariz reto e bastante largo, os dentes estavam completos, ligeiramente inclinados para frente e que tinha se barbeado na manhã de uma suposta batalha onde seria morto [A_Maspero_1889].

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Fig. 2 Visão frontal (A) e inferior (B) da múmia de Seqenenre, na publicação de Smith (1912) [A_Smith_1912]. É possível analisar o ferimento na parte superior da cabeça com 60-63 mm, já a língua já não está mais exposta (A), na outra é possível visualizar os cabelos, que seguem a descrição da análise de 1886, ou seja, são finos e enrolados (B). Imagens sob licença Creative Commons (A: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Sequenre_tao.JPG, B: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Seqenenre_Tao_head_bottom.png).

Alguns anos depois, já no início do séc. XIX, Grafton Elliot Smith (1871-1937), fez a sua análise e encontrou uma múmia com a estrutura significativamente comprometida, pois segundo ele, o que restava então era um esqueleto desarticulado e gravemente danificado. Ele estimou que Seqenenre teria aproximadamente 1.70 m, que morrera aos 40 anos de idade, forneceu algumas medidas do crânio e demais regiões do corpo e aferiu que ele era destro, por conta da robustez do úmero direito. Smith mensurou as lesões, informando que aquela da parte superior da cabeça teria 63 mm (um aumento de 9 mm em relação a medida do Dr. Fouquet), indicando que seria, com razoável certeza, que o ferimento foi sofrido durante a vida e que provavelmente causado por uma machado com ponta afiada. A outra ferida teria 31x11 mm e também seria causada por um machado. Segundo ele, dos cinco golpes recebidos, estava claro que os dois primeiros e o quarto foram causados por machado e o quinto por uma lança (ferimentos 1, 2, 4 e 5 da Fig. 2, A), todos aparentemente desferidos pelo lado esquerdo. Smith observou que a ausência de lesão nos braços ou qualquer parte do corpo mostravam que não houve resistência no momento da morte, logo, ele poderia estar deitado do lado esquerdo, provavelmente enquanto dormia, dada a disposição dos ferimentos [A_Smith_1912].

Bietak e Strouhal publicaram um estudo sobre a múmia de Seqenenre, fruto da observação in loco. A lesão da parte superior da cabeça foi mensurada e resultou em 63 mm, compatível com Smith (1912, além disso os autores indicam que aquelas efetuadas por Maspero e Fouquet, publicadas em 1889, forneceriam um valor ligeiramente menor, que seria de 54 mm, evidenciando a evolução do tamanho da mesma. Segundo os autores, o ferimento seria o resultado de um poderoso golpe, com uma machadinha larga, arma esta utilizada não apenas por egípcios, mas talvez por aliados. O golpe realizado de cima para baixo foi provavelmente mortal. A lesão supraorbital foi mensurada, resultando em 31x11 mm, indicando que a arma teria penetrado de 15 a 20 mm na cavidade cerebral e certamente teria rompido as meninges, sendo o golpe também provavelmente fatal [A_Bietak_1974].

No livro intitulado An X-Ray of the Royal Mummies, Harris e Wente corroboram que a lesão seria ante mortem e que é compatível com um ferimento causado por machado de batalha [A_Harris_1980].

Em um estudo posterior, Bernard Shaw propõe uma abordagem baseada na morte ritual de Seqenenre, onde: 1) O comandante hicso vitorioso aplica os golpes iniciais com o machado de batalha sírio-palestino MB II, na área frontal inferior direita e na bochecha esquerda; 2) O rei cai e depois recebe um golpe fatal com o mesmo machado na região superior do olho direito; 3) Um subcomandante ou vassalo egípcio desfere o golpe na região superior com um machado egípcio [A_Shaw_2009].

Anos depois, em um documentário, o também egiptologista Rob Mason, se junta a Bernard Shaw para demonstrar uma hipótese um pouco diferente, mas com o mesmo desfecho: 1) Um inimigo acerta a cabeça acabeça de Seqenenre por trás (Fig. 2, B, ferimento 5) com uma lança e ele cai da carruagem; 2) Ele se depara com um inimigo que o golpeia dos dois lados dos olhos com um machado; 3) Ajoelhado, ele recebe um golpe de machado de cima para baixo, que penetra profundamente no crânio [A_Mason_2020].

Em 2021 Saleem e Hawass efetuaram uma tomografia computadorizada na múmia de Seqenenre, onde mensuraram os ferimentos, desta vez indicando que o maior deles, posicionado na parte superior da cabeça teria 70 mm, ou seja, estava maior do que as duas primeiras mensurações, indicando que a região sofreu um comprometimento estrutural, posto que medidas anteriores indicavam 54 mm e 63 mm. Segundo os autores, tal lesão foi causada por um objeto pontiagudo, uma espada ou um machado, que foi utilizado para o desferimento de um golpe provavelmente fatal, em frente ao rei que estava sentado ou ajoelhado. O ferimento logo acima do olho direito manteve-se estável, com 32x12 mm e teria sido causado por uma arma de dois gumes, foi provavelmente fatal e o agressor estava na frente, ao lado esquerdo do rei. O estudo também indicou que Seqenenre faleceu aos 40 anos e que a sua altura era de 1.67 m (± 3 cm), corroborando com abordagens anteriores quando se leva em conta o desvio padrão [A_Saleem_2021].

Materiais e Métodos

Conceitos, Software e Hardware

A reconstrução facial forense (RFF) ou aproximação facial forense (AFF) [A_Stephan_2015], é uma técnica auxiliar de reconhecimento que reconstrói/aproxima a face de um indivíduo a partir do seu crânio e é utilizada quando há escassa informação para a identificação de um indivíduo [A_Pereira_2017]. Nota-se que a técnica não se trata de identificação, como aquelas oferecidas por DNA ou análise comparativa de arcos dentários, mas sim de reconhecimento que pode levar à posterior identificação [A_Baldasso_2020].

O presente trabalho utiliza o mesmo passo-a-passo abordado em [A_Abdullah_2022] e [A_Moraes_2024], iniciado com a configuração do crânio na cena 3D, seguindo com a projeção do perfil e estruturas da face a partir de dados estatísticos, gerando o volume do rosto com o auxílio da técnica de “deformação” anatômica [A_Quatrehomme_1997] e o acabamento com o detalhamento da face, configuração dos cabelos e geração das imagens finais.

O processo de modelagem foi efetuado no software Blender 3D, rodando o add-on OrtogOnBlender (http://www.ciceromoraes.com.br/doc/pt_br/OrtogOnBlender/index.html) e seu submódulo ForensicOnBlender [A_Pinto_2020]. O programa e o add-on são gratuitos, de código aberto e multiplataforma, podendo rodar no Windows (>=10), no MacOS (>=BigSur) e no Linux (=Ubuntu 20.04).

Foi utilizado um computador desktop com as seguintes características:

* Processador Intel Core I9 9900K 3.6 GHZ/16M;
* 64 GB de memória RAM;
* GPU GeForce 8 GB GDDR6 256-bit RTX 2070;
* Placa mãe Gigabyte 1151 Z390;
* SSD SATA III 960 GB 2.5”;
* SSD SATA III 480 GB 2.5”;
* Water Cooler Masterliquid 240V;
* Linux 3DCS (https://github.com/cogitas3d/Linux3DCS), baseado no Ubuntu 20.04.

Reconstrução 3D do Crânio

O crânio de Seqenenre encontra-se bastante lesionado, com algumas regiões comprometidas ou fora das suas posições originais. Para que pudesse ser reconstruído, foi necessário se valer de dados disponíveis em imagens e mensurações.

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Fig. 3 Projeções bidimensionais combinadas do crânio de Seqenenre.

O trabalho de Saleem & Hawass (2021) [A_Saleem_2021] dispõe de uma série de imagens sob licença Creative Commons Attribution (CC BY) que permitiu a aproximação frontal e bidimensional do crânio, com o traçado das regiões comprometidas, encaixe anatômico e espelhamento para atestar a posição original (Fig. 3, A). Com a imagem frontal e medidas fornecidas pelos autores, bem como de outros dados presentes em Harris & Wente (1980 [A_Harris_1980], Maspero (1889) [A_Maspero_1889] e Smith (1912) [A_Smith_1912], foi possível cruzar os as informações das imagens traçadas e estabelecer as correlações em eixos diferentes (Fig. 3, B, C e D). O trabalho inicial foi efetuado no software gratuito e de código aberto Inkscape (https://inkscape.org/).

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Fig. 4 Posicionamento das projeções bidimensionais nos eixos correspondentes. Vistas: Inferior (eixos X, Y), perspectiva, frontal (eixos X, Z) e laterial (eixos Y, Z).

O Blender oferece suporte nativo ao formato .SVG utilizado pelo Inkscape, de modo que bastou importar o desenho vetorial, separar os desenhos e alinhá-los conforme o eixo correspondente (Fig. 4).

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Fig. 5 Reconstrução 3D do crânio a partir de um doador virtual e início dos trabalhos de aproximação facial.

O crânio de um doador virtual foi importado e ajustado às referências nos três diferentes eixos (Fig. 5, A). Uma vez que a malha 3D do crânio estava disponível, uma série de pontos anatômicos foi distribuído na superfície da malha, de modo a projetar uma série de estruturas faciais como os globos oculares (eixos X, Y e Z), pálpebras (eixo X), lábios (eixo X), orelhas (eixo Z) e nariz (eixos X e Z) [A_Moraes_2022] (Fig. 5, B). Marcadores de espessura de tecido mole de indivíduos de ancestralidade africana foi distribuído pelo crânio, de modo a fornecer os limites da face em alguns pontos [A_Taylor_2000] (Fig. 5, C). Os limites do nariz foram projetados utilizando dados de tomografias computadorizadas de indivíduos vivos [A_Moraes_2022] [A_Moraes_2021], o que, junto com os dados dos marcadores de espessura de tecido mole, permitiu que o perfil da face fosse traçado (Fig. 5, D). A seção Declaração de Dados no final do documento conta com material didático sobre as técnicas supramencionadas.

Tabela 1 Armas responsável pela lesão na testa.

Autor

Arma

Maspero (1889)

Machado

Smith (1912)

Machado

Bietak & Strouhal (1974)

Machadinha larga

Harris & Wente (1980)

Machado de batalha

Shaw (2009)

Machado egípcio

Mason (2020)

Machado

Saleem & Hawass (2021)

Espada ou machado

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Fig. 6 Estudo da trajetória e posicionamento dos machados nas regiões de impacto.

Durante o processo de aproximação facial, foi estudada a direção do objeto causador da lesão da parte superior da testa e pela impressão deixada na superfície, indicam que a arma poderia ter entrado em um ângulo quase horizontal (Fig. 6, A e B), o que permitiu o posicionamento de um machado, conforme a observação dos vários autores citados na Introdução (Fig. 6, C). Foi utilizada a tomografia de um cérebro disponível de modo online [A_Edlow_2019], que foi ajustado ao crânio de Seqenenre, além da colocação de um complexo de veias principais para analisar o dano causado pela arma [A_Moraes_2023] (Fig. 6, D, E, ver também Tabela 1). Outro machado foi posicionado no ângulo correspondente ao ferimento logo acima da órbita direita (Fig. 6, E).

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Fig. 7 Etapas finais da aproximação facial.

A malha correspondente a tomografia de um doador virtual foi deformada, convertendo o crânio do doador em um compatível com a estrutura de Seqenenre, utilizando a técnica de deformação anatômica [A_Abdullah_2022] [A_Quatrehomme_1997] (Fig. 7, A). Um perfil final do rosto foi desenhado, interpolando os dados do traçado inicial e da deformação anatômica (Fig. 7, B). O busto foi ajustado, utilizando a interpolação de todos os dados, compatibilizando-se com as projeções faciais frontais (Fig. 7, C). Usando os dados das lesões e a posição dos machados, foi criada uma versão do rosto com ferimentos e com a deformação causada pela quebra dos ossos (Fig. 7, D). Os cabelos foram configurados segundo as observações de Maspero (1889) e Smith (1912). A coloração da pele, uma abordagem mais subjetiva do processo, encontrou certo desafio para a seleção da paleta de cores, pois não há um consenso acerca deste dado. Maspero (1889) indicou ser Seqenenre mais compatível com o grupo dos Barrabras: “Tout compte fait, il devait ressembler singulièrement aux Barabras d’aujourd’hui, et appartenir à une race moins mélangée d’éléments étrangers que celle des Ramsès”. Harris & Week (1973) [A_Harris_1973] abordam a possibilidade do rei ter origem núbia, afirmando que muitos autores a indicavam, mas a referência para tal é Smith (1912, pp. 2-3) [A_Smith_1912] e no entanto, a única descrição sobre o crânio que ele faz em tais páginas é que este seria do tipo egípcio: “The face is so badly smashed by the fatal injuries that no accurate measurements can he made, but it seems to confirm to the Egyptian type”. Já Keita (2022) [A_Keita_2022], aborda a possibilidade do rei ter herança núbia, mas deixa claro que essa abordagem não significa que as conclusões levam obrigatoriamente a tal origem. Além disso, Keita (2022) cita Harris & Week (1974), que citaram Smith (1912), que por sua vez apenas confirmou o tipo egípcio. Em face a grande incerteza dos dados, para a coloração da pele optou-se por seguir o trabalho de Coppola et al. (2017) [A_Coppola_2017], que apresenta uma gravura copiada de um relevo ainda no séc. XIX, cujas cores se aproximariam da obra original, sendo portanto uma generalização do ícone egípcio de pigmentação e não reflete necessariamente a real cor da pele, mas um parâmetro artístico da época para descrever o povo egípcio em gravuras (Fig. 7, E).

Resultados e Discussão

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Fig. 8 Posição dos machados no crânio.

O cruzamento de dados de malhas 3D e voxel data permitiu a análise do quadro proposto pelos autores que estudaram os ferimentos na cabeça de Seqenenre ao longo de mais de um século. Dois machados foram modelados, utilizando as dimensões do ferimento como referência e inseridos nas aberturas e projeções das lesões (Fig. 8, A e B). Caso tivesse a largura da última mensuração efetuada por Saleem & Hawass (2021) o machado que causou o maior ferimento teria golpeado o seno sagital superior (SGS), mas como há indicações de tamanhos diferentes ao longo das análises, os autores optaram por utilizar a base de 54 mm, informada pelo Dr. Fouquet em [A_Maspero_1889], deste modo, ainda que o ferimento tenha sido profundo [A_Mason_2020], tal estrutura (SGS) não foi comprometida (Fig. 8, C). O machado (ou outra arma) foi posicionado a 20 mm dentro do crânio, segundo observações de Bietak & Strouhal (1974) (Fig. 8, D).

Tabela 2 Evolução da Dimensão da Lesão Maior na Testa

Autor

Dimensão

Maspero & Fouquet (1889)

54 mm

Smith (1912)

63 mm

Bietak & Strouhal (1974)

63 mm?

Saleem & Hawass (2021)

70 mm

Apesar do trabalho de Bietak & Strouhal (1974) indicar que a lesão maior teria 63 mm, a imagem disponível na placa 2 (Tafel 2) da publicação já mostra uma estrutura compatível com o estudo de Saleem & Hawass (2021), indicando que mais uma parte do osso já teria se quebrado naquele momento.

Em relação a aproximação facial foram gerados quatro grupo de imagens:

Imagens objetivas da AFF: Com os dados presentes na múmia de Seqenenre, como os cabelos, mas com os olhos fechados, sem sobrancelhas e sem cílios, pois não se sabe com certeza o formato dos olhos, além de estar em escala de cinza, pois não há dados acerca da coloração original da pele. Trata-se do grupo de imagens mais robusto no contexto de conter o máximo de elementos objetivos, dentro dos parâmetros disponíveis para a modelagem física (Fig. 9, Fig. 10, Fig. 11).

Imagens coloridas da AFF: Imagens com coloração da pele, olhos abertos, cílios e sobrancelhas. Trata-se de uma abordagem com elementos subjetivos, mas dado o contexto de apresentação, são mais compatíveis com a humanização necessária para comunicação com o público geral e além disso, ainda respeita majoritariamente parâmetros objetivos, baseados em projeções anatômicas e informações presentes na múmia de Seqenenre (Fig. 12, Fig. 13, Fig. 14).

Imagens postmortem com machados: Imagens com os lábios levemente abertos, a língua entre os dentes (conforme observou Maspero, 1889), algumas lesões e deformação facial por conta das mesmas, apresentando dois machados perfurando o crânio. A coloração apresenta uma face mais pálida e optou-se por não ilustrar a presença do sangue na cena (Fig. 15, Fig. 16, Fig. 17).

Imagens postmortem com lesões: Imagens com os lábios levemente abertos, a língua entre os dentes (conforme observou Maspero, 1889), algumas lesões e deformação facial por conta das mesmas, sem as potenciais armas que causaram os ferimentos. A coloração apresenta uma face mais pálida e optou-se por não ilustrar a presença do sangue na cena (Fig. 18, Fig. 19, Fig. 20).

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Fig. 9 Imagem objetiva da AFF - frontal.

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Fig. 10 Imagem objetiva da AFF - 3/4.

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Fig. 11 Imagem objetiva da AFF - perfil.

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Fig. 12 Imagem colorida da AFF - frontal.

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Fig. 13 Imagem colorida da AFF - 3/4.

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Fig. 14 Imagem colorida da AFF - perfil.

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Fig. 15 Imagem postmortem com machados - frontal.

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Fig. 16 Imagem postmortem com machados - lateral esquerda.

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Fig. 17 Imagem postmortem com machados - lateral direita.

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Fig. 18 Imagem postmortem com lesões - frontal.

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Fig. 19 Imagem postmortem com lesões - lateral direita.

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Fig. 20 Imagem postmortem com lesões - lateral esquerda.

Conclusão

O presente trabalho foi bem sucedido em aproximar uma face a partir de dados disponibilizados digitalmente, fornecendo imagens novas e um trabalho inédito no campo, para ser acessado, estudado e debatido pelo público geral e por especialistas das áreas tangenciadas.

Declaração de Dados

Projeções advindas de medidas em tomografias - videoaula 1 de 2.

Projeções advindas de medidas em tomografias - videoaula 2 de 2. .

Planilha com a média por grupo populacional e geral das medidas efetuadas em tomografias - documento.

Funcionamento da deformação anatômica - videoaula seq 1.

Projeção nasal (perfil) - videoaula seq 2.

Agradecimentos

Ao Dr. Richard Gravalos, por ceder a tomografia computadorizada utilizada neste estudo.

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