Sistema Complementar de Projeção Nasal em Reconstruções/Aproximações Faciais Forenses

Cicero Moraes
3D Designer, Arc-Team Brazil, Sinop-MT

Davi Sandes Sobral
Cirurgião Crânio-Maxilo-Facial, Otorrinolaringologista. Hospital Irmã Dulce, Salvador-BA

Anderson Mamede
Cirurgião-Dentista, Ortodontista, Professor da Faculdade Modal, Belo Horizonte-MG

Thiago Beaini
Cirurgião Dentista, Professor Assistente - Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia-MG

ISBN: 978-65-00-29233-6

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O presente capítulo tem por objetivo explorar a precisão e limites de duas técnicas clássicas de projeção nasal em reconstruções/aproximações faciais e propor ajustes complementares baseados em dados estatísticos de indivíduos vivos, de modo a aumentar a compatibilidade da estrutura em relação à face real.

Atenção

Este material utiliza a seguinte licença Creative Commons: Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0).

Apresentação

A estimativa da anatomia de estruturas faciais pode ser desafiadora quando pouca ou nenhuma influência pode ser encontrada no crânio. A aproximação facial forense (AFF) é utilizada em casos de exame de ossadas sem identidade presumida que consiste em estimar a aparência do indivíduo na época da sua morte [A1] [A48]. Também conhecida como reconstrução facial forense (RFF), há relatos de sua utilização em muitos casos [A44] [A41]. No entanto, apesar de ser considerada uma técnica estabelecida cientificamente, persiste a busca por parâmetros e referências que permitam melhorar os resultados das aproximações [A1] [A3] [A9] [A42] [A46].

Todavia, a técnica apresenta dificuldades que vão além das já conhecidas e inerentes à mesma. Uma representação da face depende do reconhecimento por pessoas que conheçam a vítima, o que adiciona subjetivismo à técnica [A14] [A33] [A35]. No campo do reconhecimento ainda se trata de uma busca por recursos que possibilitem compreender melhor os mecanismos que influenciam na capacidade humana de comparar faces para propor métodos que potencializam ou automatizam o processo [A7] [A12] [A31] [A39].

Ao lado da orelha, boca e olhos, o nariz representa uma parte importante em qualquer AFF sendo um ponto anatômico marcante do terço médio da face [A46]. Sua forma é definida principalmente pela estimativa da sua projeção, que é a maior distância entre a ponta do nariz e a superfície óssea, sendo a demarcação do ponto antropométrico pronasale (Pn ou PRN). A largura e posição da asa do nariz também são relevantes para o processo de aproximação e pode ser relacionada à abertura da cavidade piriforme na referência conhecida como pontos alares (Al) [A45]. Porém, mesmo com esses pontos anatômicos, estimar o contorno do nariz se faz relevante e pode ser difícil determiná-lo apenas com base na análise do crânio. Muitas técnicas visam determinar tal contorno traçando linhas a partir da anatomia da cavidade piriforme e projetando-as a partir de uma linha vertical que tangencia a borda do osso nasal [A19]. No entanto, há um nível significativo de erro ao tentar utilizar apenas uma técnica.

O objetivo do trabalho é apresentar uma metodologia de aproximação do perfil sagital mediano do nariz e verificar sua coincidência com o perfil facial real em tomografias computadorizadas de feixe cônico (TCFC). Para isso, esse estudo descreve o desenvolvimento de uma ferramenta para o programa aberto, gratuito, Blender 3D e seu addon ForensicOnBlender [A34], criado com a finalidade de permitir a AFF computadorizada.

Desenvolvimento da Técnica

O presente estudo foi dividido em três etapas, sendo utilizadas 50 AFF em cada uma, totalizando uma amostra de 150 TCFC com faces reconstruídas. As aproximações foram efetuadas a partir da reconstrução tridimensional de crânios e faces extraídas de arquivos DICOM. As tomografias pertencem a um banco de dados que foi disponibilizado para uma série de estudos relacionados à face humana e entre eles está o presente capítulo. Cada exame de TCFC foi importada para o programa Blender utilizando ferramentas disponíveis no addon ForensicOnBlender, capaz de reconstruir um modelo 3D em escala real dos tecidos duros e moles.

Como o objetivo principal foi o de analisar a projeção lateral e bidimensional do nariz, deste modo utilizou-se apenas os marcadores de espessura de tecidos moles faciais no plano sagital, dispensando os demais. Tais espessuras seguem a tabela proposta por De Greef et al. (2006) [A2]

Para proceder com as aproximações no meio digital os autores optaram pelo addon ForensicOnBlender, que por sua vez é parte do addon OrtogOnBlender [A28], uma solução que roda sob a interface do Blender e fornece uma série de opções não presentes na versão nativa do software, como a digitalização de objetos por fotografias (fotogrametria, SfM) [A29], reconstrução de tomografias computadorizadas [A27], cálculos booleanos de superfícies complexas, dentre outros.

Primeira Etapa

A primeira etapa consistiu em aproximar o perfil de 50 indivíduos utilizando duas projeções, uma baseada no método de Manchester e outra no método russo [A19]. O objetivo da técnica mista é gerar uma estrutura coerente com as duas abordagens, evitando imprecisões comuns encontradas quando utilizadas uma das técnicas separadamente. No caso da metodologia de Manchester, é comum estimar uma projeção exacerbada do nariz, enquanto na abordagem russa, um nariz menor do que o original [A43].

Em todos os casos optou-se por utilizar a mesma tabela de marcadores de espessura de tecido mole, baseada em levantamento realizado em indivíduos vivos de ancestralidade européia [A2] e com IMC mediano. Em linhas gerais, mesmo que os indivíduos em questão não pertencessem a essa ancestralidade, as divergências de reconstrução com tabelas diferentes não comprometem a estrutura geral da face, como demonstrado em estudos anteriores (Wilkinson 2004, p. 149-156) [A47].

Ainda sobre esse tópico, a pesquisa tem como foco principal a região do nariz, sendo esta sob pouca influência dos marcadores de espessura do tecido mole.

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Aproximação facial do perfil comparado com a face real (tomografia reconstruída)

As 50 aproximações faciais foram efetuadas de modo cego, isto é, sem acesso ao modelo de tecidos moles, mas apenas com o crânio disponível. Apenas após ser realizada a estimativa da projeção do perfil, é que o modelo de tecidos moles era ativado e sobreposto, permitindo a comparação da aproximação em relação à face real (Fig. 1).

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Grade (em laranja) indicando os 50 pontos (em verde) posicionados na intersecção da face

Para aferir a distância entre o contorno estimado e o real foi criada uma grade com 50 linhas, distribuindo 50 pontos na intersecção das linhas com o perfil da face. Como o plano ignora o eixo X (lados) e distribuiu igualmente as linhas no eixo Z (cima e baixo), a diferença a ser observada se concentra no eixo Y (profundidade da face) (Fig. 2).

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Pontos da aproximação facial distribuídos ao longo da grade

Outro conjunto de pontos foi alinhado da mesma forma, mas usando como limite a linha da aproximação facial (Fig. 3).

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Comparação da face real (em verde) em relação a face aproximada (em amarelo)

Graças à limitação espacial e numérica foi possível comparar um número igual de pontos (50) nas 50 reconstruções (Fig. 4). A comparação feita foi a diferença entre a aproximação em relação à face real. Desse modo, se o ponto da reconstrução estivesse “anteriorizado” em relação à face real, ou deslocado positivamente em relação ao eixo Y, o valor do espaço seria positivo e caso o ponto da reconstrução estivesse mais para posterior em relação à face real, ou negativo no eixo Y, o valor seria negativo. Desta forma, dependendo do resultado, é possível saber se a face reconstruída é mais inflada ou manos inflada em relação à face real.

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Média da diferença da face aproximada em relação a real nos 50 pontos levantados em 50 faces

A análise dos dados (Fig. 5) e o levantamento das médias para cada um dos 50 pontos distribuídos ao longo da face evidenciou que a reconstrução facial, em linhas gerais, era menos proeminente que a face real, isto é, as reconstruções se mostraram um pouco menor do que o contorno real dos tecidos, exibindo valores negativos na maioria dos resultados. As maiores discrepâncias se localizam na região da base do nariz e no mento, que devido à inclinação dessas faces, em relação ao plano de frankfurt (horizontais), propiciam maiores distâncias tanto na base do nariz, quanto no mento, onde as linhas são bastante inclinadas. Isso faz com que a diferença entre os pontos seja significativamente maior se comparadas às regiões perpendiculares ao plano de alinhamento, como os dois primeiros terços da face. Analisando a região dos lábios, nota-se que essa também segue essa lógica, com o agravante de não haver um padrão de posicionamento do paciente, como em relação ao selamento ou não dos lábios.

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Exemplo de escolha oferecida pelo questionário

De posse das distâncias, ainda se fez necessário mensurar o nível de compatibilidade visual entre a face reconstruída e a face real. Para isso foi criado um formulário com a face real à esquerda e a reconstruída à direita (Fig. 6), de modo que usuários convidados escolhessem um valor de 1 a 5 onde:

  1. Totalmente incompatível (um NÃO corresponde em absolutamente nada com o outro);

  2. Traços de semelhança (dificilmente identificável);

  3. Razoavelmente semelhante (identificável);

  4. Perfil semelhante (bem identificável, porém com detalhes diferentes);

  5. Totalmente compatível (um corresponde perfeitamente com o outro).

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Resultado final da compatibilidade das aproximações versus perfis reais em relação às respostas dadas no questionário

O formulário foi respondido por 50 pessoas, das mais variadas áreas de atuação. O resultado final (Fig. 7) mostrou que 76% das faces são reconhecíveis (3-4), 22% das faces podem ser reconhecidas, mas com difícil identificação (2) e 2% das faces não podem ser reconhecidas (1).

Ainda que haja muita polêmica relacionada ao grau de sucesso de reconhecimento relacionado a faces aproximadas [A40] com a técnica utilizada neste capítulo, mesmo se utilizados os valores mais robustos (3-4), o grau de compatibilidade é compatível com os casos de sucesso apregoados por Wilkinson (75%), Gatliff (70%) e Neave (50-60%).

No entanto, mesmo que o objetivo de boa compatibilidade tenha sido alcançado, é inegável, tanto do ponto de vista estatístico, quanto visual, que as técnicas de aproximação têm problemas e estes podem comprometer todo um trabalho de aproximação, se não forem resolvidos ou, ao menos, reduzidos.

Segunda Etapa

Depois de efetuadas as primeiras 50 reconstruções, as mesmas foram detalhadamente analisadas e comparadas com as faces reais. Em linhas gerais, os dois métodos de aproximação nasal apresentaram bons resultados, como é observado na forma da estrutura desenhada pelas linhas do método russo e a direção da base do nariz, apontada pela crista nasal. No entanto, mesmo quando as duas abordagens resultavam em formas parecidas, a aproximação não necessariamente acompanhava o perfil real.

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Levantamento espacial da região nasal, composto por dois triângulos, um com dados da região óssea e outro com dados complementares do tecido mole.

Uma vez que a maioria das reconstruções efetuadas pelos autores vêm de crânios provenientes de fotogrametria e esta aborda aspectos externos do mesmo, o grupo optou por analisar a estrutura do osso nasal e a sua possível relação com a forma do nariz (Fig. 8).

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Esquema utilizado no levantamento espacial da Segunda Etapa

Foram criados dois triângulos, um superior baseado no nasion (N), no rhinion (RHI) e no limite máximo da abertura nasal no eixo Y. O outro triângulo complementar é baseado no rhinion, no pronasale (PRN) e no limite máximo da abertura nasal (Fig. 9).

Com a técnica apresentada, o objetivo da Segunda Etapa foi estimar a posição do pronasale no eixo Y (anterior), uma vez que a técnica mista de projeção falhou em algumas situações testadas, ainda que houvesse uma convergência de traçado.

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Dados das 50 faces, mostrando uma predominância de maior comprimento da Base em relação à Aperture

Das 50 reconstruções analisadas, a grande maioria contava com a variável Base maior do que a Aperture (Fig. 10). Em apenas 5 casos o contrário aconteceu, mas em apenas dois deles (4%) a diferença foi levemente maior do que 1 mm. Todos os outros 3 a diferença foi menor do que 1 mm, podendo ser classificado como coincidente em parâmetros de reconstrução facial, ou seja, dos 50 casos, em 48 a Base era maior ou igual a Aperture. Na média geral dos resultados, a Base é 12% maior do que a Aperture e isso fornece um dado importante para estabelecer a distância da projeção do ponto pronasale no eixo Y.

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Resultados médios de distâncias e graus da Base e da Aperture (Não está na escala!)

Analisando apenas os dados estatísticos da região nasal das 50 faces tomografadas, foi possível extrair um gabarito geral (Fig. 11), com a extensão média da Aperture de 30.70 mm e desvio padrão de 3.65 mm, o ângulo médio em relação a Base é de 53.20º, com desvio padrão de 5.40º e o comprimento médio da Base é de 34.50 mm com desvio padrão de 3,11 mm.

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Teste posterior do gráfico de distâncias, graus e desvios padrão (gabarito) em algumas faces

Das 50 faces, 37 (74%) mantiveram o pronasale dentro da região do desvio padrão de modo satisfatório (Fig. 12). Um achado interessante é que pouco mais da metade das reconstruções que não se adequaram a esse intervalo eram pertencentes a indivíduos com idade avançada, exibindo perda de estrutura como deficiência da maxila, com prótese total ou outras condições atípicas. Pouco menos da metade dos narizes de indivíduos adultos jovens, sem intervenção ou perda de estrutura, também não se adequaram ao gabarito geral.

Nessa etapa, buscou-se utilizar a média de projeção (gabarito) como apoio para o traçado do nariz, mas aquela estrutura servia como ponto de partida para uma projeção baseada em valores específicos do crânio em questão.

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Posicionamento e ajuste do gabarito na região nasal

Para traçar o nariz com a primeira abordagem do método complementar, primeiro se projeta com as duas abordagens clássicas (método russo e de Manchester). Em seguida, importa-se a estrutura do gabarito posicionando seu canto na região mais extrema da abertura nasal (Fig. 13, A). Posteriormente, faz-se a rotação do gabarito apontando-o para o rhinion (Fig. 13, B). Em modo de edição, move-se o ponto superior da linha da Aperture até o rhinion (Fig. 13, C), uma vez ajustada, faz-se uma cópia da estrutura rotacionando com o fulcro no canto. Daí, cria-se uma estrutura perpendicular e a posiciona mais ou menos a 12% do espaço total da distância da abertura. Neste caso a distância era de 31,70 mm e a margem foi de 3.30 mm. Com a extensão a linha do pronasale coincidiu com a média geral estatística da ponta do nariz (Fig. 13, D).

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Comparação da aproximação em relação a face real

Além da projeção do pronasale, a abordagem também estudou a distância média da columella, que seria de 8.80 mm com um desvio padrão de 1.40 mm. Feito isso, o nariz é traçado e posteriormente é feita a comparação com a face real (Fig. 14).

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Grade com 25 pontos, contendo dados do nariz original e da aproximação distribuídos na interseção das linhas nasais dos tecidos

Diferente da abordagem anterior, que mensurou os dados de todo o perfil, desta feita apenas da região estudada, compreendendo desde o marcador do nasion até o mid-philtrum em um total de 25 pontos. Novamente, foram capturados os valores apenas do eixo Y e a comparação foi feita a partir da reconstrução facial, ou seja, se a reconstrução fosse mais inflada (com mais espessura de tecidos), os valores seriam positivos, se fosse menos inflada (com menos massa), os valores seriam negativos (Fig. 15).

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Resultado dos desvios padrão na comparação com a metodologia clássica (Old Method) versus a metodologia adaptada da Segunda Etapa (Nem Method)

Das 50 aproximações feitas nessa etapa (New Method), foram levantados todos os desvios padrão da região que compreendia do nasion até o mid-philtrum em relação à mesma região nas primeiras 50 reconstruções (Old Method). Os valores foram organizados pela ordem, onde os maiores apareciam primeiro pela esquerda e os menores de modo descendente para a direita (Fig. 16). Em linhas gerais a correção na metodologia propiciou valores menores no desvio padrão, permitindo uma aproximação mais coerente com a face original.

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Resultado das médias na comparação com a metodologia clássica (Old Method) versus a metodologia adaptada da Segunda Etapa (New Method)

Além do desvio padrão também foi calculada a média geral dos pontos em milímetros e a nova metodologia também se saiu melhor do que a clássica. A abordagem testada propiciou uma tendência maior de redução ao se lançar mão das ferramentas estatísticas (Fig. 17).

Terceira Etapa

Apesar de uma melhora visual e estatística, a abordagem da Segunda Etapa ainda contava com alguns problemas relacionados à projeção, sendo esses evidenciados pelos marcadores próximos a columella e ao mid-philtrum.

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Alguns resultados da reconstrução mostraram um deslocamento da columella das aproximações no eixo Z, bem como uma significativa diferença do mid-philtrum no eixo Y. Ambas as incongruências se refletem no levantamento da grade, em especial a do pronasale, pois gera grandes discrepâncias na comparação linear horizontal

Mesmo com uma boa compatibilidade da projeção do pronasale no eixo Y, algumas vezes a discrepância se fazia presente no eixo Z (altura), geralmente deslocando a ponta da reconstrução nasal para cima, some-se a isso uma constante diferença de espessura entre o informado na tabela de espessura de tecido mole (De Greef e. al. 2006) e a espessura real, na maioria das vezes mais inflada e o resultado são distâncias mais acentuadas nas linhas que levantam os dados do eixo X (Fig. 18).

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Gabarito final proposto na Terceira Etapa, com a adição da linha de distância média da projeção pelo osso da crista e pelo incremento de espessura no mid-philtrum (Não está na escala!)

Frente ao problema do deslocamento da columella e do mid-philtrum foram levantados os dados estatísticos da distância da columella em relação ao traçado feito pela espinha nasal anterior. O resultado foi uma média de 4.80 mm abaixo do traçado, com um desvio padrão de 1.60 mm. Já na região do mid-philtrum houve uma diferença média de 4.00 mm a mais do que o proposto pela tabela utilizada, com um desvio padrão de 2.10 mm. Após essas análises foram efetuadas outras 50 aproximações faciais com a nova abordagem (Fig. 19). Com essas novas correções foi possível “amarrar” as projeções em mais pontos, utilizando os próprios dados fornecidos de modo customizado pelos ossos do nariz.

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Resultado dos desvios padrão na comparação com a metodologia clássica (Old Method) versus a metodologia adaptada da Segunda Etapa (Nem Method) versus a metodologia adaptada na Terceira Etapa (New+Comp)

Houve uma significativa redução do desvio padrão médio dos pontos relacionados à região do nariz, indicando uma maior coerência das reconstruções em relação à face real. Quando a metodologia proposta na Terceira Etapa (New+Comp) é comparada com a metodologia clássica mista (Old Method) há uma melhora significativamente grande nos números (Fig. 20).

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Resultado das médias na comparação com a metodologia clássica (Old Method) versus a metodologia adaptada da Segunda Etapa (Nem Method) versus a metodologia adaptada na Terceira Etapa (New+Comp)

Na média geral houve uma pequena melhora em relação à Segunda Etapa, no entanto aqui o progresso é menos visível posto que em linhas gerais a média não contém dados muito robustos quando as melhores se concentram em poucos pontos, como no caso daqueles relacionados à columella e ao mid-philtrum (Fig. 21).

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Histograma composto pelas três metodologias abordadas e propostas no estudo

As melhorias ficam mais evidentes quando o histograma é analisado, pois vê-se claramente que uma grande concentração de desvios padrão em pequenos valores, como o 0.5, o 1.0 e o 1.5, diferente das demais abordagens anteriores, onde temos maior concentração em valores maiores e a presença de resultados em grandes valores como 5.0-5.5 no caso da abordagem presente na segunda etapa e 6.5 na abordagem clássica, frente ao extremo de 3.5 da abordagem final proposta neste capítulo (Fig. 22).

Reconstruindo a Região do Nariz no ForensicOnBlender

A passo-a-passo descrito neste capítulo pode ser executado no OrtogOnBlender a partir da versão 2021-12-12, caso o sistema conte com um número anterior é necessário que o mesmo seja atualizado, sob a pena de não funcionamento da importação do gabarito de projeção nasal.

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Projeção nasal utilizando as metodologias clássicas

O usuário pode proceder normalmente com a colocação dos marcadores de espessura de tecido mole e como a projeção mista do nariz (Fig. 23). A técnica complementar é justamente isso, uma técnica que complementa outra já existente, grosso modo, trata-se de um complemento de correção das abordagens já conhecidas.

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Novo botão inserido na interface do ForensicOnBlender, responsável pela importação do gabarito final proposto na Terceira Etapa

Assim que a projeção inicial é feita o usuário conta com um novo botão disponível a partir da versão supracitada, o “Nose Projection”, que importa um gabarito de projeção nasal, criado a partir dos estudos efetuados em 150 reconstruções faciais (Fig. 24).

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Gabarito importado na cena

Ao clicar no botão “Nose Projection” uma estrutura em linhas é importada na cena (Fig. 25) e posicionado logo à frente da face e um pouco à esquerda da mesma (ou à direita do observador), de modo que a visualização e manipulação é feita pela vista direita ortográfica (NumLock 3).

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Separação das partes inferiores do gabarito para posterior utilização

Antes de mais nada, o usuário é orientado a separar os dois elementos inferiores relacionados à columella e ao mid-philtrum, de modo a não rotacioná-los na etapa posterior (Fig. 26).

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Posicionamento do gabarito

É quase certo que a estrutura importada tenha que ser rotacionada, de modo a alinhar o limite (borda) da abertura à direita com o apontamento dos limites superiores com o osso nasal em direção ao ponto end of nasal (Fig. 27).

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Duplicação e separação da Aperture

Em seguida é necessário entrar em modo de edição, trocar para edge e selecionar a linha superior, copiá-la (Shit+D, Esc) e separá-la da estrutura. O objetivo é criar um novo elemento, mantendo o gabarito original intacto (Fig. 28).

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Ajuste dimensional da Aperture

Assim que o elemento é separado, é necessário sair do modo de edição, selecionar o objeto que fora separado (a linha), entrar em modo de edição, mudar para o tipo de seleção vertex e estender o vértice superior até o ponto end of nasal (seta superior). Essa linha representa a Aperture do crânio cujo a face será reconstruída (Fig. 29).

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Duplicação da Aperture resultando na Base e rotação compatibilizada à projeção anterior

A linha (branca) é então copiada e rotacionada de modo que acompanhe o ângulo da projeção da espinha nasal (pontilhado amarelo) (Fig. 30).

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Adição da média de incremento

A linha copiada e rotacionada agora representa o objeto Base e o mesmo em média é 12% maior do que a Aperture. Sendo assim, é necessário criar um elemento gráfico que informe a distância a ser incrementada, no caso ilustrado neste material, um vértice foi extrusado de modo a criar uma linha perpendicular , essa foi duplicada e afastada até contar com uma distância próxima ou igual a 12% da linha principal (Fig. 31). Para mensurar a distância foi utilizado o addon MeasureIt disponível na configuração padrão do OrtogOnBlender.

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Ajuste da posição da columella

Uma vez que a projeção básica do pronasale foi efetuada, é chegado o momento de trabalhar com as estruturas que foram separadas anteriormente, primeiro posicionando a média e desvios padrão da columella (em laranja) (Fig. 32).

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Ajuste do mid-philtrum

E em seguida com a complementação do mid-philtrum, posicionando a estrutura no limite do marcador de espessura de tecido mole. Com isso todos os dados e limitações da projeção nasal estarão disponíveis para o usuário proceder com o traçado do nariz (Fig. 33).

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Traçado do tecido mole nasal até o pronasale projetado pelo gabarito

O traçado segue a partir do limite do ponto end of nasal, em direção ao limite do pronasale estabelecido pela linha Base (Aperture+12%). É importante informar que trata-se de uma abordagem estatística, com o apoio da direção apontada pela espinha nasal. No caso específico do nariz aqui reconstruído, vê-se que o seu limite coincide com um desvio padrão à esquerda, ou seja, está dentro da região tangenciada pela maioria dos narizes levantados no estudo, logo, logo, a aproximação tem uma boa chance de sucesso. (Fig. 34)

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Traçado até a columella proposta pelo gabarito

O traçado continua, passando pelo limite Y estipulado pelo pronasale, até a columella. Aqui respeitou-se o limite médio, mas há uma região de tolerância limitada pelos desvios padrão (Fig. 35.

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Traçado até o mid-philtrum proposto pelo gabarito

A última porção limitada pela metodologia complementar é aquela limitada pelo mid-philtrum e a mesma também apresenta uma média com desvio padrão (Fig. 36).

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Traçado final da aproximação facial

Ao final, tem-se o nariz aproximado fornecendo uma importante região do perfil do indivíduo (Fig. 37).

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Comparação entre a aproximação e a face real

Após a aproximação a visualização do tecido mole foi acionada e o mesmo correspondeu ao traçado de modo muito compatível (Fig. 38). Caso se utilizasse apenas a aproximação clássica o pronasale estaria significativamente mais deslocado para frente, o que é significativamente comum no método de Manchester, por exemplo.

Discussão

Embora a aproximação complementar tenha resultado em uma melhora significativa nos contextos estatísticos e visuais, o estudo se deparou com casos onde a estrutura nasal de alguns indivíduos não se adequaram totalmente à forma real. Ainda que o número de resultados incompatíveis tenha sido muito pequeno, mais estudos precisam ser implementados, de modo a compreender os motivos claros acerca das incompatibilidades. Os aspectos mais óbvios observados foram a inclinação para baixo nos narizes de idosos e indivíduos que perderam parte dos dentes ou da estrutura da maxila. Indivíduos com dentadura também geram um nariz que não se adequa aos limites de um desvio padrão bilateral, mas isso pode ser explicado pelo incremento de massa na estrutura óssea implementada pela própria dentadura.

Conclusão

A aproximação nasal clássica fornece base para reconstruções compatíveis com a face real, no entanto, mesmo quando há uma convergência entre o método de Manchester e o método russo, a probabilidade de gerar um nariz incompatível com o real ainda é significativa. Ao se complementar as duas técnicas com correções estatísticas houve uma melhora significativa na forma e uma grande redução da diferença estatística entre o nariz aproximado e o real.

Agradecimentos

Ao arqueólogo físico Jiří Šindelář pelo apoio aos estudos e fomento da técnica através da idealização de projetos que reconstruíram as faces de importantes personagens históricos da República Tcheca a partir dos seus crânios. Ao Dr. Richard Gravalos por ceder a tomografia utilizada no exemplo do passo-a-passo prático.